Fã que sou das belezas do dia-a-dia, dos fragmentos de vida no cinza do cotidiano, das singelezas das atitudes despercebidas pintando cores, creio que estou ficando até meio bobo: de repente minha vida virou só poesia. E isso é culpa dessas gentes, que não deixam de ser bonitas nunca...
É muito comum ouvir amigos meus reclamando das rodoviárias, de sua falta de conforto, seus auto-falantes, cheiro de asfalto, grande fluxo de pessoas, pressa, banheiro. Eu mesmo, quantas vezes, me pego maldizendo isso tudo. E reclamo à toa, na hipocrisia, porque na mais pura verdade posso afirmar que eu gosto de rodoviárias. E gosto do tempo ócio entre um ônibus e outro... período tão vivido nessa minha mania de ir do mar à serra, com tanta frequência.
Verdade é que eu gosto do aparente desconforto, do cheiro de ar condicionado misturado em gente, do fluxo das pessoas. Mas gosto mais da poesia que gera aquilo tudo. Eu gosto de sentar ali no canto e, imperceptível, criar histórias das indas e vindas das pessoas que passam em suas pressas, suas corridas, seus fones de ouvido, suas mãos dadas.
O homem inventou um lugar pra não ser lugar nenhum em que todos os encontros e desencontros pudessem ser feito ao mesmo tempo, por muitas pessoas diferentes, que na maioria das vezes não interagem entre si. Se tornou um coletivo de poesias individuais, de histórias que não se cruzam, mas perfumam esse pobre garoto observador.
Vou sentindo o cheiro das saudades dos que ali passam, das coragens que os impulsionam a passar, das despedidas pra nunca mais, das indas e vindas diárias, das risadas da viagem em grupo, do casal que se beija já saudoso, dos velhinhos e seus cachorros nas gaiolinhas, das crianças que, como eu, se divertem nesse espaço-poema.
Talvez rodoviária seja a metáfora do meu amor. Um lugar poesia, que as vezes não se dá muita atenção, mas se enfeita de despedidas, encontros e coragem (ou a falta de). Ou talvez eu esteja afetado demais por essas belezas. E isso é culpa dessas gentes, que não deixam de ser bonitas nunca...
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